O teor resplandecente
do silêncio que corre os veios da ilha, contempla uma importante vontade de
viajar. A ilha consente todos os espaços que evocam a dúvida e dá-nos tempo
para polir a lucidez. O âmago de quem a olha tranquilamente de dentro para fora
guarda as sementes nela colhidas. Os montes verdes, as planícies amarelas, o
silêncio do mar fossilizado nas entranhas da orla costeira e a imensidão da
gente que habita esse pedaço de terra, mantém vivo o pulsar da vereda
expansiva.
Fernando Pessoa
escreveu: “sentir é a melhor forma de viajar”. O pensamento é nómada, e essa
liberdade de podermos crescer profundamente sem a necessidade de recorrer a um
carro, um barco ou um avião, difunde a dissipação da ansiedade e dos medos que
ofuscam a busca de uma visão mais clara do universo.
Nos últimos anos tenho
dividido essa relação entre Santa Maria, ilha que me viu nascer, e o tempo a
que me proponho viajar pelo mundo. Sinto que só está completa essa vontade de
guardar a ilha na mochila e seguir viajem, quando na viajem posso guardar o
mundo na fotografia e regressar. Pergunto-me muitas vezes se teria percorrido
os mesmos países, as mesmas cidades ou as mesmas ruas se estivesse despido do
equipamento fotográfico. Nas bifurcações, nos cruzamentos e na procura dos
atalhos há sempre um brilho determinante que me conduz sempre à estrada mais
rica.
O travo milenar da
cultura do Nepal confere-lhe um núcleo magnético incrivelmente denso. Uma massa
superior capaz de atrair todo o tipo de viajantes. Contudo, na disparidade do objetivo dos que
aí se cruzam, há um silêncio que é comum a todos, uma cumplicidade guardada na
mochila que sustenta o conteúdo das mensagens partilhadas. Acredito que numa
viagem que comtempla um ambiente como o do Nepal, a mais rica de todas as
fontes é a tua entrega às pessoas que encontras no caminho. A harmonia que as
conduz dia-a-dia é tão vasta e intensa como a força que as trouxe até ti.
Poderia despir-me completamente e despender uma vida inteira para perceber o
que mora verdadeiramente nas entrelinhas do povo e da montanha. Não quero.
Senti-me quase sempre tranquilo, ligado, e procurei não negar a minha posição
de viajante e a dimensão da minha dúvida.
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